quarta-feira, 15 de agosto de 2012

O tempo, esse devorador de coisas...


“O tempo, esse devorador de coisas”, essa é a famosa concepção de tempo do poeta clássico Ovídio. O tempo devora a matéria, as ideias, os ideais, a idade e a vida.

O tempo devora a matéria. Com o tempo, toda e qualquer coisa material acaba sendo destruída. São muitas as circunstâncias geradas ao longo do tempo que fazem com que as coisas materiais se destruam.

O tempo devora as ideias, mas origina outras novas. O que se acreditou certo dia, no outro não se acredita mais.

Junto com as ideias, o tempo devora os ideais. As normas, os modelos a serem seguidos, as doutrinas, as regras. Tudo muda com o tempo.

O tempo devora a idade, ao mesmo tempo que cria a concepção de idade. Lembrando que o tempo é uma concepção criada pelo ser humano e a idade é consequência disso.

Por fim, o tempo devora a vida. Ele aumenta a idade, muda as condições ambientais e sociais, faz de tudo para acabar com a vida. O tempo já destruiu e continuará destruindo muitas espécies e indivíduos.

Apesar disso tudo, o tempo é um tempo criado pelos humanos para poder servi-los. Não existe essa história de o tempo estar ou não ao lado das pessoas. Ele apenas está ali. O jeito é aceitarmos e nos adaptamos a ele.

O tempo leva as coisas, mas traz outras. Ele leva ideias e ideais, mas logo traz outros. Leva idade e pessoas e traz outras. Leva a vida pra trazer outras. Constrói lembranças, sentimentos e sensações que se manterão através do próprio tempo.

O tempo devora as coisas para poder trazer equilíbrio. Ele, na verdade, faz a mudança e o processo de substituição. “Nada se cria ou se perde, tudo se transforma”.

O tempo é um devorador de coisas. Mas, sem ele, todos estaríamos sem tempo para nada, todos estaríamos perdidos no tempo. 

*ALICE MARTINS, 18, caloura de Jornalismo, apocalíptica e premiada. Escreve para os blogs Fragmentos e  Os Apocalípticos.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Todos somos dor

Todos somos dor. A dor da perda, da pressa, do medo, da covardia.

Todos somos, nascemos dor. A dor é aquela vontade estranha de se trancar no quarto vazio enquanto a família e os amigos ouvem o pagode e brindam a cerveja no quintal.

É aquela vontade de se esconder dos nãos da vida. É a segunda-feira do funcionário público que queria ser engenheiro da NASA. A dor é a fome, do corpo e da alma. Da gente e dos outros. A dor é saber da morte do filho pelo noticiário. Aquele filho que saiu em viagem para realizar um sonho, mas não chegou as destino. A dor é a saudade. É como dar dois nomes para o mesmo vazio.

A dor é como o apêndice, inflama e mata. É a doença contra qual os anticorpos do espírito teimam lutar. A gente até se engana, acha que esquece. Mas ela volta em uma música, em uma tarde, em uma chuva ou em uma fotografia. “Acho que a grande dor não passa jamais”, disse Nelson Rodrigues em 1967. Nunca ouvi uma verdade maior.
Penso que a humanidade carrega uma dor transcendental. Como se um dia tivéssemos cometido um pecado tão grande e imoral que pagamos com uma dor imensa, inexplicável e incurável. Ainda que sejamos felizes. Ou pensamos que somos. Eis a grande verdade da nossa existência: viver dói.

Quantos não querem voltar no tempo e ser de novo aquele garotinho ou garotinha esperando o ônibus da escola, rezando baixo pelos cantos? Sem compromisso nem responsabilidades. Porque isso também dói. Quantos não querem largar tudo de vez em quando? Mudar de rumo, ser outra pessoa, ter mais do que já tem? E quantos não querem ter de volta alguém que partiu? Quantos não querem uma companhia à noite? Um telefonema? Um olá? Porque solidão dói, e muito.

No fundo gostamos. Esperem, não me queimem na fogueira da moralidade. Quisera eu pegar a humanidade nos braços e vê-la descansar dessa corrida frenética e utópica em busca de algo que a complete. Algo que nem sabemos. E que talvez nem exista.

E digo mais: todos somos pessimistas. Uns aceitam isso mais do que outros. Todos os dias, por um milésimo de segundo sequer, pensamos como seria a vida se naquele exato dia perdêssemos algo – ou alguém – que amamos muito. Sofremos por antecipação e por vontade própria. Buscamos dor. Nós a inventamos. E por isso ela é tão presente.

Talvez não passe nunca. Talvez. Quem sabe um dia possamos inventar a cura. Encontrar uma solução, alcançar a plenitude, criar a fórmula do esquecimento. Quem sabe um dia sejamos perdoados. Quem sabe um dia passe.


*THAÍS SIQUEIRA, 22, estudante de jornalismo e fã de Nelson Rodrigues.